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Museu de Arte da Bahia: mais de um século de história dedicados à preservação da cultura baiana

O museu mais antigo da Bahia completa 107 anos de fundação nesta quarta-feira (23) com um novo conceito curatorial, novos espaços expositivos e a i...

23/07/2025 14h40
Por: Redação
Fonte: Secom Bahia
Foto: Ascom/Ipac
Foto: Ascom/Ipac

O museu mais antigo da Bahia completa 107 anos de fundação nesta quarta-feira (23) com um novo conceito curatorial, novos espaços expositivos e a inauguração da sala de audiovisual Curta MAB, um espaço para exibição de documentários, curtas-metragens, que pretende ampliar ainda mais a experiência com a arte no ambiente do museu.

Administrado pelo Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural (Ipac), órgão vinculado à Secretaria de Cultura da Bahia (Secult-BA), o Museu de Arte da Bahia (MAB) reúne um acervo de aproximadamente 20 mil peças, entre obras adquiridas pelo Governo do Estado e outras doadas por artistas e colecionadores, como pinturas, esculturas, mobiliário, porcelanas, fotografias, documentos e diversos objetos que ajudam a contar a história e a diversidade cultural baiana.

O MAB passa por uma profunda transformação em sua forma de expor e dialogar com o público. Com ambientes que reproduziam a atmosfera de residências aristocráticas e um acervo que remetia aos costumes da elite baiana do século XIX, o museu agora trilha um novo caminho, mais inclusivo e conectado com as demandas do presente.

“É um orgulho estar à frente da gestão do Ipac e celebrar mais um ano do MAB, o nosso museu mãe, em plena atividade, com novo conceito, novas exposições, ações educativas, residências e ocupações, agenda semanal movimentada e programações gratuitas. Nosso compromisso é exatamente esse: preservar essa história e garantir que as novas gerações um museu vivo, múltiplo, conectado com seu tempo”, disse Marcelo Lemos, diretor geral do IPAC.

Durante anos, a forma de expor o acervo do museu, evocava o universo doméstico das elites, com destaque para coleções como a do ex-governador Góes Calmon, gerando curiosidade e até confusão sobre a real função histórica do prédio. “O MAB está se abrindo para novas frentes, furar bolhas, unindo o público que acompanhava o museu quando ele tinha uma vertente mais colonial e buscando trazer aqueles que antes não se sentiam representados”, diz Pola Ribeiro, diretor do Museu.

Após a pandemia da Covid-19, uma reforma estrutural no telhado forçou a suspensão da antiga exposição. Com a interrupção, abriu-se também a oportunidade para repensar a missão do museu no século XXI. A percepção crescente de que a expografia anterior já não representava a diversidade de públicos da Bahia motivou uma transformação na curadoria do espaço. A proposta agora é ampliar o discurso e valorizar os agentes que historicamente foram invisibilizados — incluindo os artesãos, trabalhadores e artistas marginalizados.

A reformulação, iniciada em 2015 com a abertura do auditório para atividades culturais como óperas, capoeira, dança, teatro e música, teve papel central na aproximação do museu com a população.  “O MAB não pode ser apenas um espaço de contemplação da elite. Ele precisa refletir as múltiplas Bahias que nos constituem”, afirma a historiadora Camila Guerreiro, integrante da Comissão Curatorial de Acervo do MAB.

Essa movimentação foi fundamental para consolidar um espaço mais democrático, onde diferentes expressões artísticas e culturais ganham visibilidade. Com isso, surgiram também questionamentos sobre a representatividade do acervo e o papel social do museu.

A decisão foi clara: não reabrir o museu com a mesma lógica expográfica. O Museu buscou parceria com universidades e convidou para compor a nova Comissão Curatorial do Acervo os professores Dilson Midlej  e Alejandra Muñoz (Escola de Belas Artes da Universidade Federal da Bahia - Ufba), Joseania Freitas (professora titular do curso de Museologia da Ufba) e Lysie Reis (Universidade do Estado da Bahia - Uneb), além de Isabel Gouveia (Coordenadora de Educativo) e Celene Sousa (museóloga), ambas do MAB.

O objetivo da Comissão Curatorial é fazer uma revisão crítica de como essa coleção pode ser exibida, evidenciando questões relacionadas com preocupações atuais, como representatividade étnica, racial e de gênero. Juntos, eles vêm trabalhando em uma revisão profunda, pautada por uma abordagem contemporânea e crítica.

Entre os marcos dessa nova fase está a exposição sobre o artista Héctor Julio Paride Bernabó – Carybé, que serviu como ponto de partida para aproximar o museu do público local. A mostra foi bem recebida e revelou um movimento importante de identificação dos visitantes com a Bahia retratada por Carybé, fortalecendo o vínculo afetivo com o espaço museal. Pela primeira vez, a obra de Carybé,que integra o acervo do museu, foi exposta ao público.

A exposição “Vitória, um Corredor de Histórias” chegou para romper com padrões tradicionais, ao colocar no centro da narrativa os trabalhadores do Corredor da Vitória, uma das ruas mais emblemáticas de Salvador. O documentário e a exposição apresentaram os relatos de seis pessoas, compartilhando suas trajetórias e vivências, com o objetivo de democratizar o acesso ao espaço e reafirmar a importância desses profissionais para a construção da história e da identidade do local no qual o MAB está inserido.

História

Criado inicialmente como Museu do Estado, o MAB surgiu com caráter enciclopédico, reunindo peças históricas, etnográficas e científicas. Fundado em 23 de julho de 1918, o museu funcionava como uma extensão do Arquivo Público, abrigando registros e objetos que ajudavam a compreender a história da Bahia desde os primeiros séculos de colonização. Coube ao historiador Francisco Borges de Barros a missão de organizar o acervo e lançar as bases do que viria a se tornar um dos mais respeitados museus do Brasil.

Entre as décadas de 1930 e 1950, o MAB se fortaleceu como espaço de fomento à arte e à cultura, incorporando importantes coleções. Um marco dessa fase foi a aquisição da coleção de artes decorativas do ex-governador Góes Calmon, que trouxe ao acervo peças de mobiliário, pratarias, porcelanas, cristais e esculturas sacras de grande valor histórico.

A trajetória do museu também é marcada por mudanças de endereço. Antes de ocupar sua atual sede no Corredor da Vitória, o MAB funcionou em prédios como o Solar Pacífico Pereira e o Palacete Góes Calmon, símbolos arquitetônicos da capital baiana. Foi apenas em 1982 que o museu se instalou no edifício neocolonial onde permanece até hoje, aberto ao público, como um importante ponto de visitação, estudo e pesquisa.

Pacto de nação

De acordo com a historiadora Camila Guerreiro, que também é assessora da Diretoria do Museu, o MAB nasceu dentro de um contexto de construção de um projeto de nação. “Ele é um dos dez primeiros museus do Brasil e surge nesse momento do início do século XX em que novas narrativas precisavam ser criadas para o país pós-Proclamação da República. Assim, os governantes da época reuniram o que acreditavam ser essencial preservar para as futuras gerações”, explica.

O museu nasceu com três principais seções: etnologia, numismática e história. “A partir de 1931, a Pinacoteca do Estado, com mais de 150 peças do médico inglês Jonathas Abbott, é incorporada ao MAB. Entre elas, obras de importantes artistas da Escola Baiana de Pintura. Isso marca o início de um compromisso com o registro da produção artística local”, acrescenta.

Para a historiadora, o MAB guarda aquilo que o povo baiano produziu como arte ou considerava arte em diferentes épocas. “Temos porcelanas que eram utilizadas no cotidiano, mobiliário fabricado na Bahia, com forte influência colonial. Agora, o desafio é reinterpretar esse acervo com novas linguagens e conceitos que dialoguem com o presente. ” Por isso a relevância do museu como um espaço vivo, em constante diálogo com o presente e o futuro.

“Você vem ao MAB para descobrir o seu passado, mas também para pensar o seu projeto de presente e de futuro. Ele tem uma relação íntima com o povo da Bahia. O acervo de Caribé, por exemplo, retrata exatamente isso: o povo da Bahia, o povo de Salvador. ”

Acervo

Atualmente, o MAB reúne aproximadamente 20 mil obras, de pinturas e esculturas a gravuras, mobiliário, porcelanas e documentos raros. Além disso, abriga uma biblioteca com mais de 12 mil volumes e promove exposições temporárias, cursos, palestras, oficinas, exibições de filmes e atividades educativas.

Em 2019, o reconhecimento do trabalho do Museu de Arte da Bahia se concretizou com a concessão do Diploma e Medalha de Mérito Museológico, uma homenagem do Conselho Regional de Museologia à relevância da instituição para o país.

Curiosidades

O MAB abriga não apenas um dos acervos mais ricos do país, mas também guarda memórias pouco conhecidas que atravessam a história, a arquitetura e o papel cultural do museu na Bahia. O visitante se depara com uma das preciosidades do Museu logo na entrada. A porta do MAB é uma peça monumental reaproveitada do antigo Solar João de Matos Aguiar, demolido entre 1924 e 1927, durante o governo de Francisco Marques de Góes Calmon, para o alargamento da Ladeira da Revolta dos Malês.

Datada de 1674, a portada é composta por moldura em arenito com desenhos em trança e frontão com volutas. Já a porta de madeira, feita em vinhático e jacarandá, traz painéis retangulares com máscaras entalhadas em baixo-relevo. Ao ser incorporada à fachada do museu, a peça passou a representar não apenas a entrada, mas um convite à preservação da memória arquitetônica da cidade.

Outro tesouro, que fica logo no salão de entrada, à esquerda, é um móvel que pode passar desapercebido pelos mais apressados. Um armário entalhado, que chegou ao MAB em 2005 por meio de comodato e passou a integrar a exposição “Madeiras do Brasil e os artistas da madeira”, guarda a coleção “Riquezas do Brasil”. Reunida ao longo de décadas pelo médico e colecionador Antonio Berenguer, natural de Santo Amaro da Purificação, a coleção reúne cerca de 600 amostras de madeiras brasileiras moldadas em formato de pequenos livros.

As espécies foram coletas em fazendas do interior paulista e incluem nomes como jacarandá, ipê, imbuía, canela, louro e até madeiras de nomes curiosos, como “pau-para-tudo” e “quebra-facão”. Mais que uma excentricidade, a iniciativa de Berenguer é um gesto de amor à diversidade da flora nacional e à árvore que deu nome ao nosso país.

Um tamborete que fala

Entre os objetos mais simbólicos do acervo está o tamborete de baiana também conhecido como “mocho de vendedeira”. Feito em jacarandá, palhinha e Sebastião-de-arruda, o pequeno banco era utilizado por mulheres negras que vendiam seus quitutes pelas ruas de Salvador no século XIX.

Essas ganhadeiras, como eram chamadas, usavam o tamborete em sua rotina de trabalho, e sua presença no museu, em exposição na sala de mobiliário do século XIX, nos faz refletir sobre os processos de musealização, memória e apagamento histórico. Ao sair das ruas e ocupar um espaço museológico, o tamborete carrega vozes, resistências e histórias que ainda precisam ser ouvidas.

O que vem por aí

O MAB prepara uma programação especial para ocupar o espaço até o fim do ano, em comemoração aos 107 anos de fundação.  Em cartaz, teremos desde obras do fotógrafo, etnólogo e antropólogo francês Pierre Verger a novos trabalhos do artista plástico, ilustrador e fotógrafo Sergio Rabinovitz, que vai inaugurar a nova Galeria Jardim, na área externa do Museu.

Parte do acervo o Museu fará parte da mostra “"Tradição e invenção”, em sintonia com a nova proposta conceitual, em observância à representatividade étnica, destaca pela autoria de artistas negros, e representatividade de gênero com destaque para o papel das artistas mulheres.

O MAB ultrapassa os 100 anos de existência buscando ir além da reestruturação física, e sim firmando um novo conceito, com atualização ética e simbólica de seu papel enquanto instituição pública de cultura. Ao revisitar sua própria história e questionar a ausência de determinados grupos e narrativas, o museu marca um novo modo de retratar a arte baiana e o seu compromisso com um acervo vivo e em diálogo constante com a sociedade.

Fonte

Ascom/Ipac